segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A CARICATURIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NA ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA

                                                                                                                          A educação deve estimular a opção e afirmar o homem como homem. 

Adaptar é acomodar, não transformar (FREIRE, 1983, p. 32)

Hamilton Perninck Vieira 
Pedagogo especialista em formação de formadores pela  
Universidade Estadual do Ceará
Mestrando em Educação pela Universidade Estadual do Ceará (2013-)

É fato que a responsabilidade pela oferta da educação de um país é fundamentalmente do Estado. Neste sentido, a Constituição Federal (BRASIL, 1988, artigo 205), o Estatuto da Criança e do adolescente (BRASIL, 1990, artigos 4, 53 e 54) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996, artigo 2o), rezam que a educação é um dever do Estado, tendo como parceiros a família e a sociedade civil. O objetivo proposto para essa educação é o pleno desenvolvimento da pessoa, o preparo para a cidadania e a inserção no mercado de trabalho. 
 
Diametralmente em oposição ao que está no texto escrito da lei, a educação dentro do contexto da sociedade capitalista em que vivemos, ao invés de transformar, adapta, quando poderia equacionar oportunidades, segrega e estratifica mediante o corte de classe. Portanto, a educação trabalha contra si mesma. Nesta direção, verificamos a caricatura da educação em nosso país, de tal forma que, não percebemos a imagem real da formação humana com dignidade, mas exageros e/ou omissões propositais que tem deformado o quadro social brasileiro, principalmente da minoria desfavorecida. Por isso, nosso objetivo neste artigo é pensar como acontece esse processo de “caricaturização” da educação pública na Brasil e que caminhos podemos trilhar na direção do (re)desenhá-la à serviço do bem estar comum. 
 
Sendo assim, em primeiro lugar, é preciso dizer que o Estado Neoliberal, fruto do sistema capitalista pós-industrial, abdicou de sua função controladora da ordem social para assumir o papel de coadjuvante do capital. Antes de tudo, entendemos o Estado como uma força motriz e impessoal, mas que se personifica nas instâncias normativas da sociedade, determinando a forma de convivência e identidade da família, escola, igreja, associações de bairro, etc. Tal postura do Estado estabelece uma política sócio-estrutural que, em nossos dias, promove o bem estar da minoria em detrimento da miséria da maioria. Para disfarçar e maquiar a realidade, o Estado se utiliza de políticas de governo assistencialistas, desarticuladas e descontínuas para amenizar a situação caótica dos desfavorecidos, ao mesmo tempo em que faz deles um mal necessário à sociedade capitalista. Assim, o foco é o interesse partidário e eleitoreiro e não o bem estar da população.

Diante desse contexto político-social, em segundo lugar, o mecanismo articulador das políticas públicas é a maquiagem da realidade caótica da sociedade através de estatísticas de migração de classe social oriundas dos programas do Estado. Em compravação a essa afirmativa, dados atuais do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) demostram que houve declínio da qualidade de vida no Brasil entre 2010 e 2011. Em 2010, o Brasil era o 73o com 0.699 (o valor de referência é entre 0 e 1) pontos no ranking mundial. Já em 2011, com 0,718 pontos, caiu em relação aos demais países para o 84o lugar (PNUD, 2011). Nesta direção, as sugestivas estatísticas de emancipação social destoam da miséria, desigualdade e injustiça social nesse país. Por isso, é que a educação básica pública é ofertada em tom global e obrigatório para o Ensino Fundamental com vistas à universalidade do Ensino Médio (BRASIL, 1998, artigo 205, inciso I e II). Logo, verificamos que nas entrelinhas está à intenção de se oferecer o mínimo de formação humana, crítica e acadêmica para se perpetuar o máximo de coisificação e manutenção. Por assim dizer, percebemos claramente a instalação no imaginário social de um processo de caricaturização da educação básica pública no Brasil. Assim como numa caricatura, a imagem real e concreta da escola pública não é a realidade do que é dito e escrito sobre ela, mas reflete a deformidade resultante do sarcasmo, deboche e alienação quando ao povo não é ofertada por meio dela uma educação emancipadora e (tran)formadora da realidade social.

Mediante essa situação de usurpação do direito do povo quanto à escola pública de qualidade, em terceiro lugar, podemos nos indagar: que caminhos podemos trilhar na direção do (re)desenhá-la à serviço do bem estar comum? Tal questionamento nos mobiliza a pensar na estrutura da sociedade brasileira que se construiu historicamente na invasão, exploração, dominação e domesticação dos nossos primeiros habitantes. Aliado a isso, a corrupção, grande parte da configuração básica do nosso DNA histórico brasileiro, persegue-nos como gene determinante da estrutura individual e coletiva de sempre queremos levar vantagem em tudo. Isso tem nos impedido desde nossas origens de utopizar o futuro a partir da reflexão do nosso passado no presente. Mediante essas ponderações, acreditamos que nossa ousada luta por uma nova realidade, passa pela consciência de que a escola é fruto da sociedade que a (re)desenhou. 

Portanto, numa linguagem altusseriana, a escola é o aparelho ideológico do Estado. Diante disso, não tem como objetivo real oportunizar e libertar pessoas, mas preterir e segregar segundo a estratificação do capital. Nossa reflexão então, reverberando Freire (1981, p. 79) é que ninguém pode libertar ninguém e ninguém se liberta sozinho no âmbito dessa escola, mas que a libertação emancipadora se constrói na comunhão dos sujeitos midiatizada pelo mundo. Por isso, na fala do educador pernambucano, a mudança não reside no individualismo que isola, mas na comunhão dialógica que expande a visão do “eu” para o “nós” a partir do cosmos. Sendo assim, como na Revolução Francesa, a burguesia reivindicou uma escola pública de qualidade para seus filhos, pensamos que hoje, necessitamos nos mobilizar numa guerra pacífica, a fim de cobrar de nossos representantes eleitos no governo que parem de maquiar a realidade e busquem soluções concretas para uma realidade concreta da escola pública neste país. 
 
Enfim, na direção desta luta coletiva pela descaricaturização da escola pública básica, podemos nos utilizar de todos os mecanismos do Estado e da sociedade civil, tais como os Conselhos Escolares, ouvidorias das secretarias dos órgãos públicos competentes, assembléias e audiências públicas, redes sociais na internet, fóruns e conselhos nacionais, estaduais e municipais de educação, universidades, associações de bairro, ONGs (Organizações não-governamentais) etc. O objetivo dessa unidade social deve ser o cambate à corrupção, denúncia das omissões, cobrança de melhorias e a fiscalização coletiva do que está sendo executado na busca de uma revolução política do país. O resultado será o aumento da oferta de emprego com melhores salários, reforma e construção de escolas de qualidade, planos de cargos e carreiras do magistério inspiradores, jornada de trabalho compatível e tempo real para formação continuada dos professores, trabalho sócio-integral com a família dos educandos e a maior disponibilização de recursos didático-pedagógicos pautados nas novas tecnologias da informação e comunicação. Vamos à luta, pois a trasnformação impossível para o indivíduo é possível para a coletividade reflexiva e organizada!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei. 8.069 de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm> Acesso em: 4 abr. 2011.
_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996, Brasilia, 1996.
_______. Constituição Federal. 05.10.1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 09. out. 2009. 
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. 7.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
PNUD. Programa das nações unidas para o desenvolvimento. Ranking do IDH 2010. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/pobreza_desigualdade/reportagens/index.php?id01=3600&lay=pde> Acesso em: 4 abr. 2011.
_____. Programa das nações unidas para o desenvolvimento. Ranking do IDH 2011. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/pobreza_desigualdade/reportagens/index.php?id01=3880&lay=pde> Acesso em: 4 abr. 2011.